Noite escura da Alma, de São João da Cruz

Trecho que abre a obra


“Em uma noite escura,
com ansiedades, em amores inflamada,
oh ditosa ventura!
saí sem ser notada,
estando já minha casa sossegada.”


Este poema continua descrevendo a jornada da alma que sai em segredo, guiada apenas pela luz que ardia em seu coração, para encontrar-se com o Amado.
Reflexão:
Este trecho é profundamente paradoxal e tocante. João da Cruz apresenta a escuridão espiritual não como punição ou abandono, mas como “ditosa ventura” – uma sorte feliz. Isso vai contra nossa intuição natural de buscar sempre luz, clareza e consolação.
A “noite escura” representa aqueles momentos em que Deus parece ausente, quando nossas práticas espirituais não trazem mais conforto, quando nos sentimos secos e perdidos. Mas João nos ensina que é justamente nessa escuridão que ocorre a verdadeira purificação. Quando não temos mais as “luzes” artificiais de nossas próprias certezas, apegos e consolações espirituais, aprendemos a caminhar pela fé pura, confiando em Deus mesmo sem senti-Lo.
A imagem da “casa sossegada” é também significativa – representa o momento em que nossas paixões desordenadas, nosso ego e ansiedades finalmente se aquietam. Só então podemos “sair” verdadeiramente ao encontro de Deus, não por nossos próprios méritos ou esforços, mas por puro amor e rendição.
É uma mensagem de esperança para qualquer pessoa que atravessa momentos de dúvida, aridez ou sofrimento: essas noites podem ser o caminho para um amanhecer mais profundo.

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